quinta-feira, 26 de agosto de 2010

Psicopatologia

indice_psicopatologiaDo modo tradicional, psicopatologia é definida como uma doença da mente. Ou seja, um indivíduo apresenta psicopatologia se a sua mente está funcionando de forma anormal. Essa definição pode ser criticada em muitos sentidos.
Primeiro, será que existe uma mente que fica doente? Skinner, behaviorista radical, diz que não. Thomas Szasz, psiquiatra e psicanalista, diz que não. Para esses e outros autores, não se pode medir a mente, nem localizá-la no espaço, nem observá-la à distância; portanto, não se pode afirmar que ela existe.
Nas palavras do psicanalista Thomas Szasz:
“Uma doença é um algum tipo de funcionamento anormal do corpo humano. A mente é obviamente algo semântico, linguístico, e não faz parte do corpo humano”.
Szasz diz em poucas palavras: se não existe mente, ela não pode estar doente.
Para Skinner e Szasz, as relações humanas com o mundo são comportamentais: ou seja, os problemas ditos “mentais” são, na verdade, problemas do comportamento.  Essa afirmação significa que é na relação do indivíduo com seu mundo que estão as dificuldades. Um indivíduo deprimido exibe poucos comportamentos e relata tristeza devido à relações prejudiciais que está mantendo com o ambiente e não porque seu corpo está apresentando um mau funcionamento.
Isso nos leva a uma segunda crítica à noção clássica de psicopatologia. Iniciemos com a pergunta: ainda que não exista mente, será que existe doença do comportamento?
Parece que não. Se um indivíduo está deprimido porque perdeu alguém querido, é possível dizer que sua tristeza é anormal? E se teve uma infância na qual não foi valorizado, sua depressão é anormal? Alguém com transtorno de estresse pós-traumático por ter batido o carro, está se comportamento de maneira anormal? Se a maioria das pessoas gosta mais da cor azul do que da verde, gostar da cor verde é anormal? Ser diferente dos outros é ser anormal?
As perguntas acima parecem querer um não como resposta. A partir do momento em que se é conhecida a história de vida de uma pessoa queixosa, identificando os elementos importantes que afetam seu comportamento atual, é muito difícil sustentar que essa pessoa tem uma doença da mente. O problema dessa pessoa, sua queixa, passa a ser explicada com relativa facilidade como uma reação normal à sua história de vida.
Um teste fácil de ser realizado: tente identificar quais elementos do ambiente são responsáveis por qualquer comportamento que julgue estranho em si mesmo ou em outra pessoa. Enquanto tais elementos não forem reconhecidos, o comportamento parecerá estranho. A partir do momento em que forem encontrados os fatos ambientais responsáveis pelo comportamento, ele deixa de ser considerado anormal; sua existência torna-se normal, um resultado óbvio dos fatos.
Uma terceira crítica à noção clássica de psicopatologia diz respeito à rotulação ocasionada por essa noção. Se existe doença mental, ela deve ter um nome. O problema é que o nome termina por definir a pessoa, e não apenas a doença. Um indivíduo com o rótulo de depressivo deixa de parecer alguém comum; tratam-no como alguém com características especiais, que precisa de cuidado constante e em quem não se pode confiar. Um rótulo não é uma pessoa. A pessoa é ampla, complexa, refinada, particular. O rótulo termina com a individualidade, com o refinamento, com a complexidade, pois transforma o indivíduo em um nome.
Os rótulos se tornam especialmente problemáticos quando se descobre que não há, ainda, testes científicos que comprovem os diagnósticos psiquiátricos (e psicológicos, já que, muitas vezes estes se baseiam naqueles). Não há como provar cientificamente que existe a depressão, a esquizofrenia, o transtorno obsessivo-compulsivo, e assim por diante. Os diagnósticos são feitos com base em um manual estatístico criado por consenso, e não por observações de mau funcionamento do corpo
Psicopatologia é uma disciplina inter-científica fundamental no estudo dos estados psíquicos patológicos. É considerada, a nível teórico e clínico o coração da psiquiatria. É um campo de saber, um conjunto de discursos com variados objetos, métodos, questões. Por um lado encontram-se em suas bases as disciplinas biológicas, as neurociências, por outro, se faz ainda com inúmeros saberes oriundos da psicologia, antropologia, sociologia, filosofia, linguistica e história. É campo de atuação principalmente de psiquiatras e de psicólogos clínicos. De acordo com o pesquisador Ceccarelli, "a palavra "Psico-pato-logia" é composta de três palavras gregas: "psychê", que produziu "psique", "psiquismo", "psíquico", "alma"; "pathos", que resultou em "paixão", "excesso", "passagem", "passividade", "sofrimento", "assujeitamento", "patológico" e "logos", que resultou em "lógica", "discurso", "narrativa", "conhecimento". Psico-pato-logia seria, então, um discurso, um saber, (logos) sobre a paixão, (pathos) da mente, da alma (psiquê). Ou seja, um discurso representativo a respeito do pathos psíquico; um discurso sobre o sofrimento psíquico; sobre o padecer psíquico."[1]
A psicopatologia enquanto estudo das anormalidades da vida mental é às vezes referida como psicopatologia geral, psicologia anormal, psicologia da anormalidade e psicologia do patológico. É uma visão das patologias mentais fundamentada na fenomenologia (no sentido de psicologia das manifestações da consciência), em oposição a uma abordagem estritamente médica de tais patologias, buscando não reduzir o sujeito a conceitos patológicos, enquadrando-o em padrões baseados em pressupostos e preconceitos.
Karl Jaspers, o responsável por tornar a psicopatologia uma ciência autônoma e independente da psiquiatria, afirmava que o objetivo desta é "sentir, apreender e refletir sobre o que realmente acontece na alma do homem". No entanto, a psicopatologia é a própria razão de existir da psiquiatria, sua disciplina fundamental, básica, nuclear.
Para Jaspers, a psicopatologia tem por objetivo estudar descritivamente os fenômenos psíquicos anormais, exatamente como se apresentam à experiência imediata, buscando aquilo que constitui a experiência vivida pelo enfermo.
A psicopatologia se estabelece através da observação e sistematização de fenômenos do psiquismo humano e presta a sua indispensável colaboração aos profissionais que trabalham com saúde mental, em especial os psiquiatras, os psicólogos, os médicos de família e os neurologistas clínicos.
Autores como Jaspers ("Psicopatologia geral", 1913) e E. Minkowski ("Tratado de psicopatologia",1966) devem nos inspirar ainda a que estabeleçamos uma ponte possível entre a psicopatologia descritiva e a fenomenológica. Diferentemente de outras especialidades médicas, em que os sinais e sintomas são ícones ou índices, a psiquiatria trabalha também com símbolos. Posto isso, o pensamento, a sensibilidade e a intuição ainda são, e sempre serão, o instrumento propedêutico principal do psiquiatra, pois que, sem a homogeneidade conceitual do que seja cada fato psíquico não há, e não haverá, homogeneidade na abordagem clínico-terapêutica do mesmo. Essa é a nossa tarefa: mergulhar nos fenômenos que transitam entre duas consciências, a nossa, a do psiquiatra/pessoa e a do outro, a do paciente/pessoa. Deixar que os fenômenos se fragmentem, que suas partes confluam ou se esparjam, num movimento próprio e intrínseco a eles. Cabe-nos a leitura da configuração final desse jogo estrutural, sem maiores pressupostos ou intencionalidade, e com procedimentos posteriores de verificação. Essa é a tarefa da Fenomenologia.

Grupos ou categorias

As manifestações psicopatológicas podem ser classificadas de diversas maneiras, por etiologia a exemplo das orgânicas e psicológicas por tipo de alteração a exemplo da neurose e psicose que considera a relação com a consciência perda de contato com a realidade na concepção psicanalítica desta, etc. A categoria de classificação possui fins estatísticos ou seja de tabulação de prontuários em serviços de saúde, atestados, declarações de óbito. Entre as mais conhecidas estão a CID Classificação Internacional das Doenças e de Problemas relacionados à Saúde que está na 10ª revisão e se inciou em 1893 e o DSM referente ao Manual Diagnóstico e Estatístico de Desordens Mentais, uma publicação da American Psychiatric Association, Washington D.C., sendo a sua 4ª edição conhecida pela designação “DSM IV”. A CID-10 é a classificação usada no Brasil nos serviços de saúde para referenciar todos os quadros de enfermidades e doenças, inclusive os transtornos mentais.
O capítulo V da CID corresponde aos Transtornos Mentais e Comportamentais e inclui as seguintes categorias de classificação - que por sua vez são subdividios em sub-categorias:
F00-F09 - Transtornos mentais orgânicos, inclusive os sintomáticos. ver F00-F03 Demência
F10-F19 - Transtornos mentais e comportamentais devidos ao uso de substancias psicoativas.
F20-F29 - Esquizofrenia, transtornos esquizotípicos e delirantes.
F30-F48 - Transtorno do humor (afetivos).
F40-F48 - Transtornos neuróticos, transtornos relacionados com o stress e transtornos somatoformes. ver: F40-F41 Ansiedade
F50-F59 - Síndromes comportamentais associadas com distúrbios fisiológicos e a fatores físicos. ver: F50.0 Anorexia, F50.2Bulimia
F60-F69 - Transtorno de personalidade e do comportamento do adulto. ver: F60.2 Personalidade dissocial
F70-F79 - Retardo Mental. ver também: Oligofrenias
F80-F89 - Transtornos do desenvolvimento psicológico ver: F84.2 Síndrome de Rett
F90-F98 - Transtornos do comportamento e transtornos emocionais que aparecem habitualmente na infância e adolescência. ver: F90 Transtorno do déficit de atenção com hiperatividade
Observe-se que várias categorias de classificação podem ser desenvolvidas a partir dos critérios fornecidos por distintas teorias como por exemplo a fenomenologia que propõem a descrição a partir das manifestações observáveis ou a psicanálise que lida com modelos de relação do ego com os mecansimos inconscientes do desejo e a realidade.